terça-feira, 3 de novembro de 2009

Diarista e Empregada Doméstica - Diferentes?



Diarista e Empregada Doméstica. Trabalhos normalmente reservados à mulher. Funções idênticas. Tratamentos jurídicos diversos. Mas será que existe alguma boa justificativa?

O TST tem entendido, em vários julgados, que o critério distintivo está essencialmente no número de dias que alguém trabalha na residência de outrem. Até 3 vezes por semana, seria diarista. Mais do que 3 vezes, empregada doméstica. Não faz nenhum sentido.

Em primeiro lugar, para efeito de caracterização do vínculo empregatício, é indiferente o número de dias que alguém trabalha para outrem. Eu posso ser garçom de um restaurante e trabalhar lá apenas aos sábados e domingos, onde o movimento é maior. O mesmo se aplica ao comércio em geral, que pode perfeitamente empregar alguém para trabalhar apenas um, dois ou três dias por semana. Isso também vale para o vigia, para o auxiliar de enfermagem, para o professor, e vários outros empregados que, em muitos casos, trabalham poucos dias por semana em determinado estabelecimento. Em síntese, um empregado pode trabalhar e receber por mês, quinzena, semana ou dia, sem que isso lhe retire a condição de empregado. Distinguir a empregada doméstica da diarista é como buscar estabelecer a distinção entre animais e zebras.

Em segundo lugar, a classificação da diarista como “autônoma” revela uma impropriedade flagrante, pois cria a figura do “autônomo habitual”, ou seja, aquele que, embora seja chamado de autônomo, no fundo tem uma rotina laborativa idêntica à de um empregado e trabalha sob supervisão idêntica à que seria imposta a uma empregada. O argumento de que a subordinação estaria arrefecida no caso da diarista (em contraposição à empregada doméstica) é até razoável, mas isso se levarmos em conta o abuso que sempre se permitiu no tratamento da doméstica, alguém que sequer teria limitação de jornada estabelecida pela Constituição. Se humanizarmos o tratamento que deve ser reconhecido à empregada doméstica, o nível de subordinação da diarista é muito semelhante (e sendo “autônoma”, como insistem muitos, deveria ser próximo de zero).

Trocar a empregada doméstica pela diarista trata-se, no plano das relações de trabalho, de uma mudança bem ao gosto dos conservadores, isto é, uma mudança que não muda nada naquilo que lhes interessa. Ao contrário, o custo é basicamente o mesmo para quem paga, mas sobra o gosto de eliminar a “burocracia” dos pagamentos previdenciários e as preocupações com direitos trabalhistas. Vem à mente a frase lapidar de Lampedusa em “O Leopardo” que aqui traduzo livremente: “é preciso que as coisas mudem para que permaneçam como estão”.

Isso não quer dizer que a figura da prestadora autônoma de serviços em residência não possa existir. Por exemplo: uma trabalhadora que seja contratada apenas para limpezas mais pesadas (não habituais) em residências ou que seja contratada para ajudar na limpeza e organização de uma biblioteca, ou nos preparativos para uma festividade na residência, entre outros serviços especializados poderiam ser corretamente atribuídos a um trabalhador autônomo. Em boa síntese: o verdadeiro autônomo seria aquele que atuaria prestando serviços que não correspondessem às necessidades habituais de uma residência. Fora disso, o emprego é doméstico, seja mensalista, semanista ou diarista.

Argumenta-se que a diarista ganharia mais mensalmente (R$ 57,00 em média, segundo pesquisa do IPEA, cuja notícia abaixo apresentamos o link). Será que essa “vantagem” compensa o não usufruto do descanso das férias, o não recebimento do décimo-terceiro, a impossibilidade prática de gozar a licença-maternidade ou receber benefício previdenciário durante uma ausência prolongada ao serviço devido a doenças, entre outras vantagens que um emprego formal oferece? Será que defender o emprego doméstico é uma proposta antiquada e o posto de diarista é uma “conquista” das mulheres? Será que elas realmente poupam para as férias e conseguem descansar nesse período? Será que realmente ganham o suficiente para compensar o 13º salário que não recebem? Será que, como autônomas, contribuem para a Previdência Social e essa preocupação com acidentes de trabalho, maternidade e outros fatos geradores de benefícios é simples bobagem?

Será preciso responder? ...

Link da notícia: “Empregada doméstica dá lugar a diarista no Brasil, aponta estudo”:

 http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u646209.shtml




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