quarta-feira, 3 de março de 2010

O CUSTO DO TRABALHO NO BRASIL


Outro dia, estava dando aula de Direito do Trabalho e comentei sobre a criação da OIT em 1919 (pós-1ª Guerra) e os objetivos econômicos e humanísticos que cercaram sua criação na época e como as coisas estavam no rumo oposto no mundo contemporâneo com a ascensão dos BRICs (BRASIL, RÚSSIA, ÍNDIA E CHINA). Se, no passado, o objetivo era criar direitos trabalhistas (sociais em geral) e espalhá-los pelo mundo buscando uma certa uniformização do custo do trabalho (e naturalmente tornando mais próximos os preços dos produtos); quando a economia atual passa a ser capitaneada por um país sem nenhum compromisso com direitos sociais (CHINA), o quadro muda de figura vertiginosamente e qualquer direito trabalhista parece excessivo, desnecessário e capaz de obstruir o crescimento do país.
Observei que, nesse rompante mundial de precarização de normas trabalhistas, o Brasil ainda ocupava uma posição muito razoável, curiosamente devido a nossa história de governos populistas e autoritários que criaram uma cultura de proteção ao trabalho formal como forma de acomodar conflitos e evitar insurgências mais graves. Naturalmente, como ocorre em quase todo o semestre, alguns alunos empresários apontaram que o custo do trabalho no Brasil era "um dos mais altos do mundo" devido aos nossos malsinados encargos sociais (todos conhecem a pesquisa dos 102% de encargos sobre o salário, feita pelo sociólogo do trabalho, José Pastore, contratado das confederações patronais; embora quase ninguém conheça a da UNICAMP que contesta esse valor, o qual, de todo o modo sempre aceito como válido para efeito de construir exemplos). Perguntei se eles, como empresários, se consideravam a si mesmos bons em matemática. Talvez receosos de que eu estivesse pensando em equações complicadas, eles manearam a cabeça de um jeito meio indecifrável. Resolvi abrir alguns arquivos virtuais e fazer uma comparação do Brasil com outros países. Propositalmente, escolhi a França, um bom paralelo, por ser um "welfare" em derruição; e os EUA, sempre um bom paralelo por vários motivos. Na verdade, me aproveitei de uma escolha "jornalística" feita pela Rede Globo, no Jornal Nacional de 10 de fevereiro desse ano. Abri, inicialmente, o vídeo do Jornal Nacional onde se tem a "pesquisa" do sociólogo, José Pastore, fazendo a confrontação do custo dos encargos sociais no Brasil (102% sobre o salário), com o da França (79%) e dos EUA (9%). A matéria do Jornal Nacional acabou aqui e ponto final. Ficamos com a convicção formada de que no Brasil o custo é demasiado e que o excesso de proteção aos trabalhadores afeta a nossa “competitividade internacional”.
Nada se disse que, segundo números do Departamento do Trabalho dos EUA (2009), o custo horário da mão-de-obra manufatureira nesses países é também muito desigual. Na França, a hora de um trabalhador custa 27,59 dólares; nos EUA, custa 24,57 dólares; e, no Brasil, 5,96 dólares. Quando somamos isso com os encargos chegamos à conclusão de que a hora de trabalho no Brasil custa cerca do 1/5 do valor francês e pouco mais de 1/3 do valor americano. Baseado nesses números, cuja leitura me parece deva ser conjugada, onde você, empresário internacional, montaria sua empresa? Se você respondeu: "nenhuma das anteriores, eu apostaria na China", é uma excelente resposta capitalista, mas o Brasil não deixa de ser uma boa opção para práticas trabalhistas baratas e um pouco mais civilizadas.
Professor Daniel Sampaio.


terça-feira, 17 de novembro de 2009

Intervalo intrajornada no transporte coletivo urbano - TST a toda velocidade...



INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. NÃO CONCESSÃO OU REDUÇÃO. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. INVALIDADE. EXCEÇÃO AOS CONDUTORES DE VEÍCULOS RODOVIÁRIOS, EMPREGADOS EM EMPRESAS DE TRANSPORTE COLETIVO URBANO.

I – É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a surpressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1998), infenso à negociação coletiva.


II – Ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho a que são submetidos estritamente os condutores e cobradores de veículos rodoviários, empregados em empresas de transporte público coletivo urbano, é válida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a redução do intervalo, desde que garantida a redução da jornada para, no mínimo, sete horas diárias ou quarenta e duas semanais, não prorrogada, mantida a mesma remuneração e concedidos intervalos para descanso menores e fracionários ao final de cada viagem, não descontados da jornada.

Metas processuais de grande porte. Horizonte nebuloso para a Justiça do Trabalho.

O CNJ encostando na traseira. O ônibus está lotado (e tem gente querendo subir).

Quase sem querer, o TST pisa ainda mais forte no acelerador.

Recortando a estrada lateral ao despenhadeiro.

O combustível está no limite. Há alguma gritaria no interior do ônibus. Mas ele não pode reduzir a marcha.

O estresse de quem está indo a toda velocidade talvez justifique os riscos.


Nessa semana, por decisão do Pleno, o TST ratificou, sob a forma de uma nova redação para a OJ 342 da SBDI-1, um dos seus entendimentos mais controvertidos. Cedeu à pressão dos sindicatos de trabalhadores da área do transporte coletivo urbano e aprovou uma orientação jurisprudencial  que contraria a própria diretriz histórica do TST no que se refere ao intervalo intrajornada como norma de ordem púlbica não sujeita à disponibilidade das partes em negociação coletiva (embora não possamos nos queixar da falta de precedentes dentro do próprio tribunal). Nos últimos anos, muitos julgados do TST têm entendido que, em face das "particularidades" do transporte coletivo urbano, a proibição de não se permitir a redução ou fracionamento do intervalo intrajornada não seria aplicável ao setor. Esperava-se que, com uma reflexão mais detida, o entendimento fosse revertido, afinal,  o raciocínio a ser empregado no caso há de ser justamente o oposto: no transporte coletivo urbano, onde estão em jogo a segurança e a vida de um número indeterminado de pessoas, onde os interesses extrapolam a órbita de patrões e empregados, acenando riscos para toda a coletividade; aí mesmo é que o descanso dos profissionais que conduzem veículos deveria ser sagrado, não se admitindo encurtamento ou fracionamento. Mas o TST não teve tempo para refletir ou pensar. Segue a toda velocidade...

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Estabilidade dos Suplentes de Dirigentes Sindicais - Luz no Fim do Túnel no TST...



Depois de várias decisões afirmando que a estabilidade dos dirigentes sindicais apenas ficariam circunscritas a 7 dirigentes (sem distinguir entre titulares e suplentes), o TST sinalizaou um pouco de lucidez e a SBDI-1 proferiu decisão que reconhece o direito a 7 membros e extensivo a 7 suplentes. Essa é, sem dúvida, a posição mais razoável, haja vista que o ponto de vista anterior praticamente tornava "letra morta" a proteção constitucional assegurada ao suplente. Se apenas 7 seriam protegidos (entre titulares e suplentes), era óbvio e natural que os sindicatos optassem por proteger os titulares que estavam atuando em prol da categoria. Agora é torcer para que o posicionamento ganhe força e se torne a base da jurisprudência do TST. Parabéns ao Ministro Vieira de Mello Filho.

Abaixo, transcrevo a notícia, que tem como fonte o site do TST. Os negritos e cores foram alterações feitas por mim para realçar aspectos que julguei interessantes na notícia:



11/11/2009
Estabilidade de dirigentes sindicais se estende a sete suplentes


A garantia provisória de emprego do dirigente sindical e do respectivo suplente está sustentada nos artigos 8º, inciso VIII, da Constituição, e 543, parágrafo 3º, da CLT. Com o julgamento que restabeleceu sentença condenando a empresa Reunidas S.A. – Transportes Coletivos a reintegrar uma trabalhadora, a Seção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho marca entendimento no sentido de essa proteção ser aplicada até o limite também dos sete suplentes. Apesar da divergência, prevaleceu, por maioria, o voto do relator, Ministro Vieira de Mello Filho.

Segundo o ministro Vieira, é essa a interpretação que deve ser dada à análise conjunta dos preceitos constitucionais e legais. Para o relator dos embargos, que reformou decisão da Terceira Turma, a estabilidade provisória alcança “não apenas os sete dirigentes sindicais do artigo 522 da CLT, mas também os sete respectivos suplentes”. Por essa abordagem, o limite de dirigentes alcançados pela estabilidade pode chegar a catorze. O ministro relembra que a proteção legal dirigida aos suplentes, incluída na Constituição, foi reconhecida posteriormente ao artigo 522 da CLT e não objetivou reduzir o número de dirigentes sindicais titulares lá discriminados.

A Constituição assegura a estabilidade provisória aos empregados eleitos para cargo de direção ou representação sindical, bem como a seus respectivos suplentes. No entanto, como esclarece o ministro Vieira de Mello, “o texto constitucional não define, e nem seria sua atribuição, os limites dessa proteção jurídica, essencial ao desempenho das funções atribuídas aos dirigentes sindicais”.

A definição desses limites cabe à legislação ordinária, pois, conforme explica o relator, “não se admite que essa garantia possa ser outorgada, indiscriminadamente, a número ilimitado de empregados”. Nesse sentido, conclui que deve ser observado, para fins exclusivos de limitação da garantia de emprego aos dirigentes sindicais, o disposto no artigo 522 da CLT – ou seja, uma diretoria constituída de, no máximo, sete e, no mínimo, três membros e de um Conselho Fiscal composto de três membros.

O posicionamento divergente defende, para a aplicação da estabilidade sindical, o máximo de sete como limite tanto para os membros efetivos quanto para os suplentes. De acordo com esse entendimento, defendido pelo ministro Horácio Senna Pires, se “a estabilidade provisória constitui uma exceção ao princípio geral do poder potestativo (da vontade) do empregador de rescindir o contrato sem justa causa, sua interpretação e aplicação devem sempre ocorrer de forma restritiva”. (E-RR - 205/2005-026-09-00.1)



terça-feira, 10 de novembro de 2009

Participação nos Lucros Mensal ... Veio para ficar !

A negociação coletiva é um "dogma" para muitos. A notícia publicada hoje (10 de novembro) no site do TST parece reforçar a idéia de que, em nome desse dogma, devotamente seguido por alguns, muita coisa pode ser feita. Pior: foi uma decisão por unanimidade proferida na SDI-1, o que significa uma forte tendência de se solidificar o entendimento. É interessante notar que a Lei 10.101/2000 prevê a possibilidade da PLR semestral justamente porque presumiu que o pagamento em períodos menorres (mensal ) da parcela representaria a diluição  mascarada de um aumento salarial. Tal presunção , aliás, faz todo o sentido, haja vista que a PLR só não é considerada remuneração porque a Constituição estabelece dessa forma, ou seja, trata-se de uma parcela de natureza salarial, haja vista seu caráter contraprestativo em face de resultados obtidos pela empresa, que é considerada "não salarial" por força da Constituição). O que a SDI-1 parece ter feito nesse julgamento não foi simplesmente ignorar a legislação, foi declarar a sua inconstitucionalidade em abstrato  (!) afirmando que a Constituição Federal, no que se refere à autonomia coletiva (reconhecimento de convenções e acordos coletivos), seria ferida caso a lei ordinária fosse prestigiada.

Segue a transcrição da notícia:

Notícias do Tribunal Superior do Trabalho


10/11/2009
TST autoriza Volkswagen a parcelar participação nos lucros


Cláusula de acordo coletivo que estabelece pagamento mensal de parcela intitulada participação nos lucros é válida. Com esse entendimento, a Seção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho deu provimento aos embargos da Volkswagen do Brasil Ltda. e autorizou o parcelamento da participação nos lucros, previsto em norma coletiva firmada entre empresa e sindicato dos trabalhadores.

A SDI-1 acompanhou, por unanimidade, voto da relatora, ministra Maria Cristina Peduzzi, no sentido de que a questão do pagamento da participação nos lucros deve ser decidida à luz dos princípios constitucionais da autonomia coletiva e valorização da negociação coletiva, conforme os artigos 7.º, XXVI, e 8.º da Constituição Federal.

Ainda segundo a relatora, a cláusula coletiva que instituiu verba indenizatória (participação nos lucros) e estipulou o pagamento parcelado é resultado do exercício válido da prerrogativa conferida a trabalhadores e empregadores pelo texto constitucional, com a finalidade de estabelecer normas aplicáveis às suas relações de trabalho.

No caso em questão, o Tribunal do Trabalho da 2ª Região (SP) havia negado pedido do trabalhador de integração salarial da participação nos lucros. Essa decisão foi mudada pela Sexta Turma do TST, que, ao analisar recurso do empregado, concordou com o argumento de que a cláusula coletiva estabelecendo o parcelamento desrespeitava o artigo 3.º, parágrafo 2.º, da Lei n.º 10.101/2000, que proíbe a distribuição da parcela em período inferior a um semestre ou mais de duas vezes no ano.

O entendimento adotado pela Sexta Turma foi o de que a autonomia das negociações coletivas não é absoluta. Por essa razão, julgou inválida a cláusula prevendo o pagamento mensal da participação nos lucros como forma de remuneração dos empregados, na medida em que a parcela passaria a ter natureza salarial, e não indenizatória, nos termos da legislação.

No entanto, como explicou a ministra Peduzzi ao julgar os embargos à SDI-1, a legislação ordinária não pode restringir o exercício de garantias constitucionais, a exemplo das negociações coletivas. Pelo contrário, o acordo deve ser prestigiado. Portanto, ainda que a cláusula em discussão tenha previsto o pagamento da participação nos lucros de forma parcelada (diferentemente do que dispõe a Lei n.º 10.101/2000), não há violação legal na hipótese, pois a regra está amparada em acordo coletivo que reproduziu a vontade das partes. (E-ED-RR- 2.182/2003-465-02-40.6)
(Lilian Fonseca) 

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Diarista e Empregada Doméstica - PL 160/2009

Ontem, 4 de novembro, tive a oportunidade de representar o Ministério do Trabalho em audiência pública na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal, em que se discutia o Projeto de Lei n.º 160/2009, o qual busca atribuir regulação jurídica à atividade das diaristas, afirmando não haver vínculo se o serviço é prestado por até 3 dias por semana na mesma residência, o que é absurdo (ver post anterior sobre diaristas e domésticas). Algumas conclusões que apresento a respeito do tema e do "senso comum" parlamentar que presenciei:
- O trabalho da diarista, nos moldes atuais, é a pura e simples substituição de uma empregada doméstica por uma trabalhadora dita "autônoma". Na verdade, uma falsa autônoma, pois a diarista nada mais é do que uma empregada doméstica contratada para prestar serviços por dia (qualquer empregado pode, nesses termos, ser diarista). Logo, "autonomia" de fato não existe, pois o trabalho é tão subordinado quanto qualquer emprego, o que se altera é apenas  o número de dias trabalhados na semana e a forma de pagar a remuneração pelo serviço (passa a ser por dia).
- Há quem diga haver "lacuna" jurídica sobre a diarista. Bobagem! Se ela fosse autônoma de verdade, já existira normatização suficiente no ordenamento jurídico brasileiro (o problema seria de mero esclarecimento da "nova categoria"). O fato é que todos sabem - embora alguns finjam não saber - que a diarista é uma empregada doméstica que trabalha por dia. Logo, a tal "lacuna" é fruto dessa inconsistência entre o que se sabe ser verdade e o que alguns desejam apresentar como tal.
- Há uma sobrevalorização (retórica) do valor das diárias. No Senado, alguns parlamentares disseram que os parâmetros salariais giravam em torno de R$ 70,00 a R$ 80,00 por dia. Totalmente irreal!  O valor das diárias tem mais relação com o poder aquisitivo dos tomadores de serviços e, sendo o Brasil o país da disparidade de renda, revela-se igualmente variável. Assim, de fato, em bairros e comunidades mais abastadas (certamente as que alguns parlamentares frequentam), o valor das diárias é mesmo alto. Por outro lado, na medida em que as diaristas atendem as mais diversas classes sociais (inclusive as classes C e D), o valor das diárias tende a se tornar mais baixo por razões óbvias. Para se ter uma idéia, basta pensar num exemplo curioso: uma diarista, para ir trabalhar, deixa seus filhos aos cuidados... De outra diarista. Precisa explicar que os valores das diárias recebidas por uma e por outra serão bastante diferentes?
O mais correto seria pura e simplesmente assegurar a conversão das situações atuais de diaristas em empregadas domésticas, buscando incluir no valor já pago das diárias os encargos trabalhistas e previdenciários. Isso reduziria o valor das diárias recebido em dinheiro pelas trabalhadoras (efeito negativo de curto prazo), mas certamente ampliaria a sua rede de proteção. Direitos trabalhistas e previdenciários dizem respeito à saúde, segurança e estabilidade financeira/social do trabalhador.
Infelizmente, muitos só dão valor quando precisam e descobrem que não têm.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Trabalho Doméstico - menores de 18 anos

O Brasil ratificou a Convenção 182 da OIT e se comprometeu a eliminar as piores formas de trabalho infantil.
Importante: criança, para os fins da convenção, é qualquer pessoa com menos de 18 anos (art. 2º).
 Mais que isso: as piores formas de trabalho infantil abrangem os trabalhos que, por sua natureza ou pelas circunstâncias em que são executados, são suscetíveis de prejudicar a saúde, a segurança ou a moral da criança (art. 3º). O trabalho doméstico coloca a pessoa com menos de 18 anos (moças, em geral) em contato direto com a intimidade da família, sem limitações de jornada e tornando-as mais vulneráveis às práticas assediadoras, tanto moral quanto sexual. Um risco desnecessário.

Por isso (mas nem só por isso), na listagem brasileira das piores formas de trabalho infantil (Decreto 6.481/2008), foi incluído o trabalho doméstico dentre as proibições, considerando os seguintes riscos ocupacionais:
  • Esforços físicos intensos; 
  • isolamento; 
  • abuso físico, psicológico e sexual; 
  • longas jornadas de trabalho; 
  • trabalho noturno; 
  • calor; 
  • exposição ao fogo,
  • posições antiergonômicas e movimentos repetitivos;
  • tracionamento da coluna vertebral; 
  • sobrecarga muscular e queda de nível
Precisa mais?

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Diarista e Empregada Doméstica - Diferentes?



Diarista e Empregada Doméstica. Trabalhos normalmente reservados à mulher. Funções idênticas. Tratamentos jurídicos diversos. Mas será que existe alguma boa justificativa?

O TST tem entendido, em vários julgados, que o critério distintivo está essencialmente no número de dias que alguém trabalha na residência de outrem. Até 3 vezes por semana, seria diarista. Mais do que 3 vezes, empregada doméstica. Não faz nenhum sentido.

Em primeiro lugar, para efeito de caracterização do vínculo empregatício, é indiferente o número de dias que alguém trabalha para outrem. Eu posso ser garçom de um restaurante e trabalhar lá apenas aos sábados e domingos, onde o movimento é maior. O mesmo se aplica ao comércio em geral, que pode perfeitamente empregar alguém para trabalhar apenas um, dois ou três dias por semana. Isso também vale para o vigia, para o auxiliar de enfermagem, para o professor, e vários outros empregados que, em muitos casos, trabalham poucos dias por semana em determinado estabelecimento. Em síntese, um empregado pode trabalhar e receber por mês, quinzena, semana ou dia, sem que isso lhe retire a condição de empregado. Distinguir a empregada doméstica da diarista é como buscar estabelecer a distinção entre animais e zebras.

Em segundo lugar, a classificação da diarista como “autônoma” revela uma impropriedade flagrante, pois cria a figura do “autônomo habitual”, ou seja, aquele que, embora seja chamado de autônomo, no fundo tem uma rotina laborativa idêntica à de um empregado e trabalha sob supervisão idêntica à que seria imposta a uma empregada. O argumento de que a subordinação estaria arrefecida no caso da diarista (em contraposição à empregada doméstica) é até razoável, mas isso se levarmos em conta o abuso que sempre se permitiu no tratamento da doméstica, alguém que sequer teria limitação de jornada estabelecida pela Constituição. Se humanizarmos o tratamento que deve ser reconhecido à empregada doméstica, o nível de subordinação da diarista é muito semelhante (e sendo “autônoma”, como insistem muitos, deveria ser próximo de zero).

Trocar a empregada doméstica pela diarista trata-se, no plano das relações de trabalho, de uma mudança bem ao gosto dos conservadores, isto é, uma mudança que não muda nada naquilo que lhes interessa. Ao contrário, o custo é basicamente o mesmo para quem paga, mas sobra o gosto de eliminar a “burocracia” dos pagamentos previdenciários e as preocupações com direitos trabalhistas. Vem à mente a frase lapidar de Lampedusa em “O Leopardo” que aqui traduzo livremente: “é preciso que as coisas mudem para que permaneçam como estão”.

Isso não quer dizer que a figura da prestadora autônoma de serviços em residência não possa existir. Por exemplo: uma trabalhadora que seja contratada apenas para limpezas mais pesadas (não habituais) em residências ou que seja contratada para ajudar na limpeza e organização de uma biblioteca, ou nos preparativos para uma festividade na residência, entre outros serviços especializados poderiam ser corretamente atribuídos a um trabalhador autônomo. Em boa síntese: o verdadeiro autônomo seria aquele que atuaria prestando serviços que não correspondessem às necessidades habituais de uma residência. Fora disso, o emprego é doméstico, seja mensalista, semanista ou diarista.

Argumenta-se que a diarista ganharia mais mensalmente (R$ 57,00 em média, segundo pesquisa do IPEA, cuja notícia abaixo apresentamos o link). Será que essa “vantagem” compensa o não usufruto do descanso das férias, o não recebimento do décimo-terceiro, a impossibilidade prática de gozar a licença-maternidade ou receber benefício previdenciário durante uma ausência prolongada ao serviço devido a doenças, entre outras vantagens que um emprego formal oferece? Será que defender o emprego doméstico é uma proposta antiquada e o posto de diarista é uma “conquista” das mulheres? Será que elas realmente poupam para as férias e conseguem descansar nesse período? Será que realmente ganham o suficiente para compensar o 13º salário que não recebem? Será que, como autônomas, contribuem para a Previdência Social e essa preocupação com acidentes de trabalho, maternidade e outros fatos geradores de benefícios é simples bobagem?

Será preciso responder? ...

Link da notícia: “Empregada doméstica dá lugar a diarista no Brasil, aponta estudo”:

 http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u646209.shtml