sábado, 31 de outubro de 2009

Teoria do Conglobamento - Aplicação Prática






Conflito entre Acordo Coletivo e Convenção Coletiva.
Teoria do Conglobamento

Quando uma convenção coletiva e um acordo coletivo são aplicáveis a um mesmo empregado, surge a questão: qual deles deve ser aplicado? A idéia de que seria sempre o acordo, por ser mais específico, embora tenha lógica, não atende ao critério estabelecido pelo art. 620 da CLT, que determina a aplicação da norma mais favorável. Entre as teorias da acumulação e do conglobamento, o ordenamento jurídico brasileiro (segundo nossa jurisprudência) optou pelo último. Aqui vai um trecho de acórdão do TST que se refere à teoria do conglobamento e sua aplicação prática. A decisão em si segue a linha que tem norteado a jurisprudência trabalhista já há muito tempo. Vale à pena pela fundamentação trazida na própria ementa cuja transcrição parcial se faz aqui:

(...) II) ACORDO COLETIVO E CONVENÇÃO COLETIVA - REQUERIMENTO DE PREVALÊNCIA DE CLÁUSULAS ESPECÍFICAS DA CONVENÇÃO COLETIVA - TEORIA DO CONGLOBAMENTO - EXEGESE DO ART. 620 DA CLT. 1. O art. 620 da CLT fala em prevalência das -condições- estabelecidas em convenção coletiva quando mais favoráveis àquelas previstas em acordo coletivo. O uso do plural leva ineludivelmente à conclusão de que o legislador não se afastou da teoria do conglobamento, segundo a qual cada instrumento normativo deve ser considerado no seu todo, e não cláusula a cláusula isoladamente. 2. O fundamento racional da teoria (as -boas razões- de Norberto Bobbio para a positivação do Direito) está no fato de que as condições de trabalho estatuídas em instrumento normativo são objeto de negociação global, na qual determinada vantagem é concedida pela empresa ou sindicato patronal como compensação pela não-inclusão de outra, de tal forma que o conjunto das condições de trabalho e remuneração passam a ser aceitáveis por ambas as partes. 3. Pinçar isoladamente, de instrumentos normativos diversos, as cláusulas mais benéficas para o empregado ou reputar inválidas cláusulas flexibilizadoras de direitos concernentes a remuneração ou jornada (passíveis de flexibilização, na esteira do art. 7º, VI, XIII e XIV, da CF), olvidando que a cláusula vantajosa ou desvantajosa para o empregado somente é instituída em face de compensação com outras vantagens ou desvantagens, seria quebrar o equilíbrio negocial, desestimulando a concessão de vantagens alternativas, desconsideradas em face do que se consubstanciaria em superlativo protecionismo por parte do Estado-Juiz. 4. Exegese diversa dada ao art. 620 da CLT (como também ao art. 7º, VI, XIII, XIV e XXVI, da CF), com desconsideração da teoria do conglobamento, apenas contribuiria para o desestímulo à negociação coletiva, implicando a substituição das soluções autônomas pelas heterônomas para os conflitos coletivos do trabalho, pela multiplicação dos dissídios coletivos e retorno ao paternalismo estatal, incompatível com o atual estágio de evolução das relações capital-trabalho. 5. Assim sendo, não se admite a aplicação isolada de norma de Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), quando reguladas as relações de trabalho, no âmbito da empresa, por Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), a menos que se adote a CCT por completo, o que não foi pretendido pelo Reclamante, que apenas postulou o pagamento de reajustes salariais e de participação nos lucros e resultados com base nas cláusulas da CCT. (...)
Processo: RR - 514/2002-007-09-00.0 Data de Julgamento: 26/04/2006, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, 4ª Turma, Data de Publicação: DJ 19/05/2006.


Flexibilização 1





Participação nos lucros mensal! 
A nova idéia do TST



Não é raro que o TST nos surpreenda com alguma novidade em termos de reconhecimento da negociação coletivo como mecanismo idôneo para a flexibilização de direitos. A negociação coletiva é, de fato, o meio mais democrático. Contudo, o problema é o estabelecimento de limites sobre o que se pode negociar. A novidade mais recente é a possibilidade de parcelamento mensal da participação nos lucros e resultados (algo expressamente vedado pela lei). Não faz o menor sentido: se a PLR só pode ser instituída via negociação coletiva, é muito evidente que a limitação de dois pagamentos anuais com periodicidade não inferior a um semestre é dirigida à negociação coletiva e por ela deveria ser respeitada. PLR mensal é (e historicamente sempre foi, por isso veio a limitação da Lei 10.101/2000) uma forma de mascarar aumento salarial, reduzindo a incidência dos encargos. Tais fraudes, muitas vezes avalizadas pelo sindicato dos trabalhadores, trazem prejuízos diretos à sociedade (especialmente pela evasão de tributos) e aos próprios trabalhadores individualmente considerados (que passam a ter PLR como algo habitual, sem que tal parcela se projete, por exemplo, no 13º, nas férias, no FGTS, etc.).

Abaixo, dois julgados ilustrativos (há VÁRIOS):

EMBARGOS. DECISÃO EMBARGADA PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.496/2007. ACÓRDÃO TURMÁRIO PUBLICADO EM 05.12.2008. EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS - PLR. PARCELAMENTO. NORMA COLETIVA. VALIDADE. PROVIMENTO.
1. Em respeito ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, que assegura o pleno reconhecimento da negociação coletiva, deve-se dar validade ao acordo coletivo de trabalho que estabelece o pagamento antecipado e parcelado da parcela intitulada participação nos lucros e resultados. Neste caso, tal norma coletiva, além de refletir a vontade flexibilizadora das partes quanto a parcela acessória ao salário, não trouxe qualquer prejuízo aos trabalhadores, mesmo porque não evidenciado que a empresa estivesse mascarando uma recomposição salarial através do parcelamento mensal da PLR. Buscou-se, sim, a proteção do bem maior do trabalhador, o seu emprego, visto que, no aludido acordo coletivo, previa-se a redução da carga horária com a correspondente diminuição salarial. 2. Recurso de embargos de que se conhece e a que se dá provimento. ( E-RR - 1297/2003-462-02-00.0 , Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 17/09/2009, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 02/10/2009)

PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS - VERBA ESTABELECIDA EM NORMA COLETIVA PREVENDO O SEU PAGAMENTO MENSAL - NATUREZA DA PARCELA. 1. A participação nos lucros e resultados encontra-se prevista na Carta Magna, cujo inciso XI do art. 7° impõe, de plano, a sua natureza indenizatória, porque desvinculada da remuneração do trabalhador. 2. Regulamentando esse preceito constitucional, veio a lume a Lei 10.101/00, que, em seu art. 3°, estatui que a participação nos lucros e resultados não substitui ou complementa a remuneração devida a qualquer empregado, nem constitui base de incidência de nenhum encargo trabalhista. Já o § 2° do referido art. 3° dispõe que não poderá haver o pagamento da participação em periodicidade inferior a um semestre civil. 3. No caso, havia norma coletiva que estabeleceu o pagamento mensal da participação nos resultados como forma de recomposição da remuneração. 4. Ora, se é certo que os acordos valem como lei entre as partes, não menos correto é que a norma convencional não pode contrariar legislação em vigor, no caso, a Lei 10.101/00. 5. Assim, como, na hipótese, as Partes acordantes desviaram-se dos objetivos e da finalidade da lei, autorizando o pagamento mensal da participação nos resultados, visando a recompor a remuneração mensal dos trabalhadores da Reclamada, tem-se que tal ajuste coletivo é inválido e não subsiste aos termos da legislação em vigor.
6. Contudo, a SBDI-1 desta Corte, em recentes pronunciamentos (cfr. TST-E-ED-RR-1.236/2004-102-15-00.4, Min. Red. Desig. Moura França, DJ de 24/04/09 e TST-E-ED-RR-1.447/2004-461-02-00.0, Min. Red. Moura França, DJ de 17/04/09), vem entendendo que, a despeito do contido no art. 3º, § 2º, da Lei 10.101/00, no sentido de vedar o pagamento da participação nos lucros em periodicidade inferior a seis meses, o acordo coletivo firmado entre a Volkswagen e o sindicato representante de seus empregados, o qual expressamente dispôs que o pagamento da participação nos lucros, relativa ao ano de 1999, se daria de forma parcelada e mensal, retratou fielmente o interesse e a vontade das Partes, não tendo o pactuado suprimido a parcela, mas apenas estabelecido a periodicidade de seu pagamento, em caráter excepcional, o que não autoriza, entretanto, o reconhecimento da sua natureza salarial.
7. Assim, sendo, ressalvado entendimento pessoal, é de se validar a negociação coletiva, ainda que em detrimento da vedação legal. Recurso de revista não conhecido. ( RR - 194/2005-102-15-00.5 , Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 27/05/2009, 7ª Turma, Data de Publicação: 12/06/2009)

PERICULOSIDADE e BOMBEIRO CIVIL


Novidade legislativa: Lei 11.901/2009 assegurou o adicional de periculosidade ao bombeiro civil (a figura do "bombeiro civil" também foi uma criação legislativa e corresponde àquele que, habilitado nos termos da lei nova, exerça, em caráter habitual, função remunerada e exclusiva de prevenção e combate a incêndio, como empregado contratado diretamente por empresas privadas ou públicas, sociedades de economia mista, ou empresas especializadas em prestação de serviços de prevenção e combate a incêndio)

Trata-se de hipótese específica, não se confundindo com a genérica prevista na CLT, que assegura adicional aos que mantiverem contato permanente com explosivos e inflamáveis. Transcrevo abaixo o dispositivo (art. 6º):

Art. 6o É assegurado ao Bombeiro Civil:

I - uniforme especial a expensas do empregador;
II - seguro de vida em grupo, estipulado pelo empregador;
III - adicional de periculosidade de 30% (trinta por cento) do salário mensal sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa;
IV - o direito à reciclagem periódica.

Crítica: os bombeiros, militares ou civis (nos termos dessa lei), de fato atuam em atividade que deve ser considerada perigosa. Ocorre que a lei, ao atribuir o adicional tanto para quem combate como para quem previne incêndios, parece ter igualado duas situações razoavelmente diferentes. O verdadeiro perigo está presente para aqueles que têm como dever profissional combater situações de incêndio, atuando habitualmente nessa função. Já a atuação preventiva, sem que haja exposição verdadeira a risco, é louvável, merece todo o nosso respeito, mas não deveria ser remunerada com adicional. Em síntese: fica a sensação de que o legislador parece ter sido muito generoso em relação ao adicional de periculosidade. A técnica utilizada, aliás, é incorreta, pois o referido adicional deve ser atrelado a uma sujeição reiterada a um determinado risco, sendo sempre inconveniente adotar-se a técnica de se "contemplar" uma única carreira.